A idade veio bater em minha porta.
Estendeu-me um grande embrulho
Com papel pra lá de desbotado.
Procurava o velho,
Dono da casa.
Respondi, de forma educada:
“- A senhora dever ter se enganado.
Eu sou o proprietário e, como bem pode
Ver, minha idade nada tem
De avançada.”
Seus olhos fitaram os meus por um breve instante:
“- Desculpe-me o engano, meu jovem.
Porém, não obstante o equívoco da
Expedição de encomendas,
Acredito haver aqui algo seu.”
- Disse, oferecendo-me seu melhor sorriso
E um pequeno pacote cor de breu.
Tinha meu nome na etiqueta.
Reconheci a datilografia.
Quem usa máquina de escrever hoje em dia?
Na ânsia curiosa de conhecer o conteúdo, rasguei o papel.
Seus pedaços flutuavam ao meu redor
Por tudo quanto era lugar aonde chegava o ar.
Espantado com a arrumação,
Aquietei-me, esperando que a poeira baixasse.
Os retalhos continuaram a circundar-me
Como um grande tubarão.
Então percebi:
Cada pedaço rasgado
Era um retalho do meu passado.
Eu via imagens e sentimentos dançando à minha volta!
Sons, cheiros, cores,
Amores e decepções,
Felicidade e Revolta.
Riso e lágrimas alternavam-se de braços dados,
Rodopiando tal qual quadrilha em festa de São João
Quando as lembranças finalmente
Cessaram de brincar,
Fugindo das minhas mãos,
Deixei-me cair no chão frio.
Enquanto o silêncio sacudia minha alma
Como uma rajada de tiros dentro d’água,
Usei o dorso das mãos
Para secar a face.
Estranhei sentir ranhuras na minha pele.
Levantei e fui até o espelho do banheiro
- Demorei mais que de costume.
Parecia estar em uma montanha
Tentando alcançar o cume.
Vi um reflexo.
Era um tanto quanto
Sem nexo:
Parecia comigo
Mas, onde passaram lágrimas sorrisos
Existiam vincos,
Pequenas cordilheiras erodidas no rosto.
Sorri, e um sorriso tosco
Brotou no canto da boca da face que me encarava
Aturdido, apoiei-me na aldrava para voltar ao quarto
Estava tudo limpo e arrumado.
Sobre a cama,
Apenas um grande embrulho
Com papel pra lá de desbotado.
quinta-feira, 30 de junho de 2011
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