quarta-feira, 28 de maio de 2008

A medida certa do amor (20080527DF)

Nunca mais digo que te amo demais.

Não quero abraçar-te demais,

Beijar-te demais,

Querer-te demais

Ou sequer fazer-te um carinho a mais.

Amo-te tanto quanto é possível amar alguém,

- Para muitos um lugar inalcançável.

Admitir que te amo demais

Seria ter a pretensão de medir um sentimento imensurável,

O qual, em movimentos lépidos,

Zombeteiramente escapa de quaisquer sistemas métricos.

Admitir que te amo demais,

Seria professar a possibilidade da existência

De um menos gostar de ti

Quando não existem reticências

Tampouco aqui ou acolá,

Medida certa ou errada.

Existe amar

Que é tudo,

E mais nada.


sexta-feira, 23 de maio de 2008

Racional (DF 14042008)


Minha razão toma-me de assalto,

É bruta, eloqüente, mordaz,

Capaz de atirar para o alto

Uma cristaleira das mais raras

Por um simples momento de paz.

É a senhora cujos caminhos sigo

Sem questionamentos.

Entrego-a em penhora meu destino

Sem a menor garantia de emolumentos.

Por vezes é até cruel,

Mas não guardo ressentimentos

Ela não faz por mal,

Cuida de mim como fosse minha progenitora.

Incentiva, agoura,

Espanca sem dó,

Afaga, lambe as feridas,

Aconselha-me quando estou só.

É odiada, é amiga,

É sábia sem medida.

Tão racional é minha razão...

Sabe até quando deve calar-se

E deixar falar apenas o coração!

domingo, 18 de maio de 2008

Obrigado, Banco de Talentos - FEBRABAN 2007


Poesia escolhida :


Linhas da Vida

Publiquei-me.

Quando li, percebi que estava cheio de erros.

Falhou a revisão à minha visão retorcida.

Não fiz alarde:

Também falham, cedo ou tarde,

Os aterros na contenção do mar,

As capas na contenção das páginas,

As pálpebras na contenção das lágrimas,

A memória na contenção dos momentos,

Os intestinos na contenção dos excrementos

- Sem querer ser rude, admito ser mais poética

A falha dos meninos na contenção da juventude. -

A despeito das muletas onde sustento minhas escusas,

Reli-me do início ao meio

- As linhas do desfecho ainda são confusas, escalafobéticas. -

Reconheci-me em um arremedo de métrica:

Reticências sem seqüência...

Princípios em minúsculas

Com maiúsculas expectativas!

Períodos fora de época,

Ações defectivas,

Vírgulas apavoradas,

Impotentes ante o desemprego das palavras

Nos parágrafos sem justificativa.

Sujeitos passivos, substantivos sem substância,

Dispostos a guardar apenas distância

Daquela burocrática reunião,

Onde cada letra se contorcia

Como fosse um garrancho de próprio punho.

Enfim, a pretensão de antologia

Encontrava a vocação para rascunho.

Meu Cel de Brasília (18052008 DF)


Era uma tarde em nuvens:

Eu a apreciava da varanda de um prédio de esquina

No sudoeste da capital federal.

Lembrava-me da peça que falava em não falar mal

De uma tal de rotina,

Onde, a certa altura, era lida uma poesia

Exaltando a beleza do céu de Brasília.

Eu , um carioca mais acostumado a contemplar o mar,

Não havia ainda percebido o modo certo de olhar!

Sim, pois, é de outra maneira...

Não o tentem ver com um simples vislumbre de cartão postal.

Parece querer este céu absolver-nos,

Livrar-nos de qualquer mal.

Ajustei a câmera do celular...

Estranho lembrar:

Na peça, falou-se também do aparelhinho.

Naquele momento, ao capturar a imagem,

Captei também a mensagem:

Olhar para o céu é ser feliz sozinho,

À noite ou durante o dia.

Não obstante desanuviado

Ou no acúmulo dos cúmulos,

Quando parece congestionado.

Ocorreu-me um pensamento,

Desde então recorrente

(E isso muito me apetece ):

Ao ligar meu cel ao céu do DF,

Era o meu ohar maravilhado

Quem estava a ser, na verdade, fotografado.

segunda-feira, 12 de maio de 2008

Previsões e o Tempo


Se é pouco o tempo

Diz-se dele que ainda não sabemos

Se é extenso,

Diz-se que o perdemos

Mas... Quem diz?

Aqueles com os quais a rima perderia o sentido,

Usasse o verbo ‘dizer’ na terceira pessoa do presente

E um estado de felicidade que, quem só diz, não sente.

Aliás, pensando bem, ora pois,

Para quê terceira pessoa?

Bastamos nós dois.


domingo, 11 de maio de 2008

O Solitário Desejo (11052008 DF - A pedido de uma queridíssima amiga...)


Fosse a saudade uma flor,

Quantas pétalas teria ela?

(Consegue me responder a ciência?)

Seria de bom tom brincardes assim de malmequer,

Despetalando meu coração com a angústia da tua ausência?

Enquanto a saudade cobre meu corpo

Como uma frondosa hera,

Você, despido de qualquer sentimento,

Procura-me apenas para serenar meu particular tormento

Com homeopáticas doses de um amor

Que mais parece uma quimera.

Eu não digo que quero,

Nem digo que não,

Meu corpo, meus lábios,

Tratam de, por conta própria, silenciarem minha razão.

Sepultam a minha certeza de bombardear-te com franqueza

Sem dar-te tempo de buscar abrigo,

Na esperança de que possas me amar,

E finalmente ser franco comigo.

Atropelamento e Fuga (11052008 DF)


Era um indivíduo precavido,

Atento a todos os detalhes.

Não descuidava das portas

- Sempre dava duas voltas nas chaves -

Verificava com minúcia os cadeados.

Estava sempre abrigado contra o sol e a chuva.

Olhava para todas as direções antes de atravessar a rua.

Conduzia o carro como se fizesse uma prece,

Tinha todos os dispositivos de proteção:

Cintos, airbags, ABS...

E diploma de primeiros socorros do curso de especialização.

Motorista experiente, com a mesma calma ia por pistas sinuosas,

Retas, mansas e caudalosas.

Ignorava resultar em placebo

As prevenções contra o seu mais íntimo medo.

Nunca se imaginara naquela situação.

E ali, prostrado, estirado no chão,

Viu suas certezas desaparecerem,

Suas mãos suarem e tremerem,

O coração disparar em agonia,

Sem ao menos se importar com os radares

Espalhados pela rodovia.

Escurecida a visão, seus olhos brilhavam,

Guardando as fotos tiradas no momento do acidente.

O momento para o qual estava fadado.

Quando, inadvertidamente, pelo amor,

Fora impiedosamente atropelado.




sábado, 10 de maio de 2008

O bêbado, o equilibrista e o cantor de chuveiro...

Imagina um sujeito cara-de-pau... O cara canta no chuveiro e sua voz ecoa no prédio inteiro. Não satisfeito em perturbar os vizinhos mais próximos, o fuça-de-peroba grava um vídeo e posta na internet para o alcance ser maior. Podem ficar calmos: As imagens são do teto do banheiro. Não quero ser conhecido pelo corpinho escultural... Ah, antes de sacanear, grave um. Mas só vale se tiver o barulho do chuveiro ao fundo e nenhum recurso técnico de edição de voz. Ah, e esse eu gravei com um celular SonyEricsson W580i. Chupa essa manga!!!





quarta-feira, 7 de maio de 2008

Caixa Preta (07052008DF)

Quando a aeronave espatifou-se contra o solo naquela ensolarada manhã de abril, as emissoras de rádio e televisão transmitiam ao vivo a cerimônia de formatura dos cadetes do sétimo regimento. Foi tudo muito rápido. Em uma manobra exaustivamente praticada, o caça perdeu altura e acabou-se em uma bola de fogo. A esperança do piloto ter ejetado logo foi dando lugar ao desespero. O resgate chegava rápido ao local da queda, mas só havia chance de recolher os pedaços do avião e do piloto, Capitão Adam Avlis. Tinha acabado de se formar e esse era o seu primeiro vôo de exibição. Um filme passou na cabeça da sua mãe, que assistia à cerimônia do palanque central: Desde pequeno o filho sonhara com aquele momento, quando deixava de lado os carrinhos e a bola de futebol para brincar com aviões de papel. Cresceu, estudou, e nunca pensou sequer em seguir outro caminho. Viveu a vida inteira para aquele momento. Viveu a vida inteira para morrer ali, na sua frente. Ela, apesar de toda a dor, sabia que o filho estava realizado. Tinha certeza que valera a pena. Os outros tentavam entender o porquê dele não haver seguido outro caminho, inconformados de uma trajetória tão bela terminar assim. Soubesse ele, talvez tivesse topado tudo de novo. Ou faria tudo diferente, brincaria com os carrinhos e a bola de futebol. Sem viver, nem ele, nem ninguém tem como dizer . Pois é, fica tão mais fácil julgarmos quando não estamos calçados nos sapatos do réu. Entendo a natureza humana e acolho os veredictos com o respeito que ocasionalmente falta ao júri. Mas não peçam para eu aceitar a cobrança por uma sabedoria que ninguém jamais terá. Vão viver, filhos.

terça-feira, 6 de maio de 2008

A Foto E A Síntese.(06052008DF)

Tempo estranho:

No quarto escuro e nublado

Eu mesmo dou conta de acordar meus pesadelos.

Temo mais é ficar só

Do que temo meus próprios medos.

Nessa hora onde a fé fenece,

Até se oferece a agonia

Bela dama de companhia.

Horas, são quase oito.

Pergunto se é dia ainda.

E você, linda, ri sem graça ao meu lado,

Direto do passado estampado no porta-retratos.

Eu, na foto, grito.

Mas, no quarto, permaneço imóvel, mudo,

Ao lado de um cinzeiro boquiaberto,

Com o cigarro na boca a enfumaçar tudo.

Quando o vermelho desbota,

A paixão já queimou tudo o que tinha.

Então não sobram rosas,

Apenas cinzentas cinzas.

Vejo as flores na foto,

Só elas esmaecidas.

Esquecidas as cores,

Desbotados os amores,

Por ora, mãos de mãos vazias.

No aguardo das emoções virarem adubo,

Outra vez brotarem

E perfumarem a fumaça dos dias.


domingo, 4 de maio de 2008

Cuidados básicos com a saudade. (05052008DF)


A felicidade é uma porta

Por onde a saudade não passa,

Finge-se de morta para não ir em frente.

Fechada a porta, faz algazarra,

Bagunça, maltrata, exibe todo o seu orgulho.

Mas ao menor barulho, fica novamente imóvel,

Desfalecida à soleira.

Espera que alguém, com dó,

Venha tentar soerguê-la.

Não venham!

Nunca se agarrem às suas pernas,

Observem-na de longe, admirem suas belas matizes,

Ou alijados serão de seguirem em frente

Em busca de serem outra vez felizes.