quinta-feira, 28 de julho de 2011
Tormenta
Como um avião sem asas,
Um botão sem casa
Solto no mundo.
Vai ao raso,
Mergulha fundo,
Suando em bicas.
Se acaba nos braços,
Pelo tempo de um pulsar.
Meu navio atraco
Sem ter a noção
De ser eu a embarcação
Cargueira das emoções.
O ponto fraco
De minhas amarras
É a madeira gasta do porto,
Capaz de me segurar
Apenas enquanto o mar
Faz-se de morto.
Pareceu me escutar:
A marola tira-me do prumo,
Na espera da borrasca.
O vento chega.
Não sopra segredos:
Grita impropérios
Enquanto despedaça as velas
Com seus dedos etéreos.
Eu vejo meus medos
Dançarem pelo convés,
Zombando do meu olhar mareado.
Cospem em meu rosto
Chuva com gosto amargo.
Adormeço à deriva.
O calendário devora os dias,
As horas escorrem-lhe
Pelos cantos da boca.
Momentos, migalhas,
Segundos espalhados
Sobre a mesa tosca,
Sobrevoados por um pequeno
Esquadrão de moscas
Zunindo no meu despertar.
O sol se opõe ao mar revolto,
Transforma os vagalhões
Em uma carranca de bronze.
Escuto as gaivotas na calmaria...
É.
Hoje é outro dia.
terça-feira, 5 de julho de 2011
A Palavra Castrada
Em um porto de metáforas,
Enquanto partia meu coração
Em uma prosopopéica odisséia
De pleonasmos múltiplos
Que se contorciam,
Emaranhavam-se,
Esfregavam-se,
Entregavam-se em uma orgia de línguas estranhas,
A revirar suas entranhas
Na tentativa de extrair esperança
Dum um último suspiro,
A derradeira concordância.
Viro quase uma preposição,
Sem disposição
Para qualquer posicionamento.
Uma voz passiva,
Quase muda
Sussurra imperativos obscenos,
Paulatinamente embuçados
Pelo véu das palavras não ditas,
Dos verbos não conjugados.
Só resta o ponto final,
Impotente,
Essa exclamação sem pau
Que não leva nada aos “finalmentes”.
sábado, 2 de julho de 2011
No avião (01/07/2011, em algum lugar entre DF e RJ)
Descortinei as pálpebras momentos após as rodas deixarem o chão...
Através da diminuta janela, saltou a escuridão dos meus olhos para o mundo,
Um abismo com pequenos pontos luminosos no fundo.
Parecia o céu ao contrário,
Um corolário de estrelas.
Se eu procurasse por Deus lá fora poderia jurar que Ele estava lá embaixo, em um reino qualquer.
Mas encontro mesmo Deus é em mim, num vôo solo pelo céu da minha boca.
Coisa louca isso de perder o olhar ao longe, como se existisse um criador que da criatura se esconde.
A criatura que o procura erguendo as mãos para o alto parece não saber o que procurar.
Deus está no DNA.
quinta-feira, 30 de junho de 2011
Encomenda para você (Alexandre Damasceno. DF 30062011)
Estendeu-me um grande embrulho
Com papel pra lá de desbotado.
Procurava o velho,
Dono da casa.
Respondi, de forma educada:
“- A senhora dever ter se enganado.
Eu sou o proprietário e, como bem pode
Ver, minha idade nada tem
De avançada.”
Seus olhos fitaram os meus por um breve instante:
“- Desculpe-me o engano, meu jovem.
Porém, não obstante o equívoco da
Expedição de encomendas,
Acredito haver aqui algo seu.”
- Disse, oferecendo-me seu melhor sorriso
E um pequeno pacote cor de breu.
Tinha meu nome na etiqueta.
Reconheci a datilografia.
Quem usa máquina de escrever hoje em dia?
Na ânsia curiosa de conhecer o conteúdo, rasguei o papel.
Seus pedaços flutuavam ao meu redor
Por tudo quanto era lugar aonde chegava o ar.
Espantado com a arrumação,
Aquietei-me, esperando que a poeira baixasse.
Os retalhos continuaram a circundar-me
Como um grande tubarão.
Então percebi:
Cada pedaço rasgado
Era um retalho do meu passado.
Eu via imagens e sentimentos dançando à minha volta!
Sons, cheiros, cores,
Amores e decepções,
Felicidade e Revolta.
Riso e lágrimas alternavam-se de braços dados,
Rodopiando tal qual quadrilha em festa de São João
Quando as lembranças finalmente
Cessaram de brincar,
Fugindo das minhas mãos,
Deixei-me cair no chão frio.
Enquanto o silêncio sacudia minha alma
Como uma rajada de tiros dentro d’água,
Usei o dorso das mãos
Para secar a face.
Estranhei sentir ranhuras na minha pele.
Levantei e fui até o espelho do banheiro
- Demorei mais que de costume.
Parecia estar em uma montanha
Tentando alcançar o cume.
Vi um reflexo.
Era um tanto quanto
Sem nexo:
Parecia comigo
Mas, onde passaram lágrimas sorrisos
Existiam vincos,
Pequenas cordilheiras erodidas no rosto.
Sorri, e um sorriso tosco
Brotou no canto da boca da face que me encarava
Aturdido, apoiei-me na aldrava para voltar ao quarto
Estava tudo limpo e arrumado.
Sobre a cama,
Apenas um grande embrulho
Com papel pra lá de desbotado.
segunda-feira, 23 de maio de 2011
MEC – Minixtério da Educassão e Cutura
segunda-feira, 2 de maio de 2011
O avesso (Alexandre Damasceno)
No mundo
Fosse pra você
E todos meus pensamentos
Tivesse que te dizer
Meus mais profundos segredos
Meus medos
Seriam, num estalar de dedos,
Seus;
E eu
Não seria
Mais eu.
Por isso bata na porta,
Toque a campainha
Quando quiser entrar;
Pois a alma
É uma casinha
Onde só uma pessoa
Pode morar.
Não queira domar
Meu desejo,
Me comprar com um beijo
Ou me vender,
Me trocar;
Como aquela roupa
Que, no provador,
Você jurou gostar.
Eu te vi pelo espelho
E minha pele lhe caía bem,
Mas o que ela vale
Nem você,
Nem ninguém tem.
É foda:
Por isso hoje estou fora de moda.